A Lei Delegada (LD) é uma espécie normativa primária, elaborada pelo Presidente da República mediante delegação expressa do Congresso Nacional. Essa delegação ocorre por meio de uma resolução do Congresso Nacional, que especificará o conteúdo e os termos de seu exercício. Trata-se de um ato normativo com força de lei, cuja utilização tornou-se rara no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente após a Constituição de 1988, que fortaleceu instrumentos como a Medida Provisória.
A Constituição Federal estabelece limites materiais e formais para a delegação. Certas matérias não podem ser objeto de delegação, e o ato de delegação deve ser preciso quanto ao seu alcance.
Fundamentos
- Constituição Federal de 1988:
- Art. 59: “O processo legislativo compreende a elaboração de: (…) IV – leis delegadas;”
- Art. 68: “As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.”
- § 1º: “Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre:
I – organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;
II – nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais;
III – planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.”
(Limitações Materiais à Delegação) - § 2º: “A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício.” (Forma e Conteúdo da Delegação)
- § 3º: “Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda.” (Possibilidade de Controle Congressual Prévio à Edição)
- § 1º: “Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre:
Controle
- As Leis Delegadas, como atos normativos com força de lei, submetem-se ao controle de constitucionalidade:
- Controle Político/Preventivo:
- Pelo Congresso Nacional: Ao especificar o conteúdo e os termos da delegação na resolução.
- Pelo Congresso Nacional: Se a resolução determinar, o projeto de lei delegada será submetido à apreciação do Congresso em votação única, sem emendas (art. 68, § 3º, CF/88).
- Controle Jurisdicional/Repressivo:
- Assim como as demais leis, as Leis Delegadas podem ser objeto de controle de constitucionalidade difuso (por qualquer juiz ou tribunal) e concentrado (pelo STF, via ADI, ADPF). O controle pode versar tanto sobre os limites formais da delegação (ex: se a resolução foi devidamente expedida) quanto sobre os limites materiais (ex: se a lei delegada extrapolou o conteúdo da delegação ou versou sobre matéria indelegável, ou se é incompatível com a Constituição).
- Controle Político/Preventivo:
Enunciados
- S.M.J. não há registro(s) de súmulas específicas dos tribunais superiores tratando diretamente do conceito ou da aplicação de Lei Delegada, reflexo de sua escassa utilização sob a égide da CF/88.
Precedentes
- S.M.J. não há registro(s) de precedentes qualificados (Repercussão Geral, Recursos Repetitivos, etc.) especificamente sobre Lei Delegada, dada a sua raridade no período pós-CF/88. As discussões doutrinárias e eventuais menções jurisprudenciais costumam se basear mais na interpretação do art. 68 da CF/88 do que em casos concretos de aplicação contenciosa de leis delegadas recentes.
Jurisprudência
- A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre Leis Delegadas é extremamente escassa no período pós-Constituição de 1988. Eventuais análises tendem a focar nos requisitos constitucionais da delegação e nas matérias vedadas.
- No passado (sob égide de constituições anteriores que também previam a delegação legislativa, como a de 1946 e a de 1967/69), houve maior produção de leis delegadas e, consequentemente, alguma discussão jurisprudencial, mas que não se transpõe diretamente para o atual arranjo constitucional sem as devidas adaptações.
- Exemplo (histórico e para fins de ilustração do mecanismo, não da CF/88): A Lei Delegada nº 4, de 26 de setembro de 1962, que dispôs sobre intervenção no domínio econômico para assegurar a livre distribuição de produtos necessários ao consumo do povo, foi editada sob a égide da Constituição de 1946, com base na Lei Delegatória nº 2/1962.
Doutrina
- Conceito e Natureza Jurídica: Para Alexandre de Moraes (Direito Constitucional, Atlas), a Lei Delegada é um ato normativo elaborado pelo Chefe do Executivo, mediante autorização específica (delegação) do Poder Legislativo, e sobre matérias delimitadas. Trata-se de uma exceção ao princípio da separação de poderes, na qual o Legislativo transfere temporariamente parte de sua função típica.
- Requisitos da Delegação:
- Solicitação do Presidente da República ao Congresso Nacional.
- Aprovação de uma resolução pelo Congresso Nacional especificando o conteúdo da delegação e os termos de seu exercício (prazo, por exemplo).
- Matérias Indelegáveis (Art. 68, § 1º, CF/88): A Constituição proíbe expressamente a delegação para legislar sobre:
- Atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, da Câmara ou do Senado.
- Matéria reservada à Lei Complementar.
- Organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, carreira e garantia de seus membros.
- Nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais.
- Planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.
- Desuso Relativo: A Lei Delegada tem sido um instrumento legislativo de pouquíssima utilização após a promulgação da Constituição de 1988. Segundo Pedro Lenza (Direito Constitucional Esquematizado, Saraiva), a agilidade e a amplitude (embora com restrições) da Medida Provisória (art. 62 da CF/88) acabaram por tornar a Lei Delegada uma opção menos atraente para o Presidente da República exercer funções normativas em situações que demandem celeridade ou iniciativa do Executivo.
- Formas de Delegação:
- Delegação Típica: O Congresso Nacional apenas edita a resolução delegatória e o Presidente edita a lei delegada, que entra em vigor diretamente.
- Delegação Atípica (ou com apreciação posterior): Prevista no art. 68, § 3º, da CF/88, onde a resolução delegatória pode determinar que o projeto de lei delegada seja submetido à apreciação do Congresso Nacional, que o votará em turno único, sem possibilidade de emendas. Nesse caso, o Congresso exerce um controle político antes da entrada em vigor da lei.
Correlato
- Constituição Federal — estabelece as hipóteses e os limites para a edição da Lei Delegada.
- Processo Legislativo — a Lei Delegada é uma das espécies normativas previstas.
- Presidente da República — é a autoridade competente para elaborar a Lei Delegada, mediante autorização.
- Congresso Nacional — é o órgão que delega ao Presidente da República a competência para elaborar a Lei Delegada, por meio de resolução.
- Resolução (Processo Legislativo) — é o instrumento pelo qual o Congresso Nacional formaliza a delegação legislativa para o Presidente da República.
- Medida Provisória — instrumento normativo de uso mais frequente pelo Presidente da República, com força de lei, que em parte substituiu a funcionalidade prática da Lei Delegada.
- Separação de Poderes — a Lei Delegada representa uma exceção mitigada a este princípio, ao permitir que o Executivo exerça função legislativa mediante autorização do Legislativo.
- Controle de Constitucionalidade — mecanismo pelo qual se afere a compatibilidade da Lei Delegada com a Constituição.