A Medida Provisória (MPV ou MP) é um ato normativo com força de lei, de competência exclusiva do Presidente da República, que pode adotá-la em casos de relevância e urgência. A MPV produz efeitos jurídicos imediatos a partir de sua publicação, mas depende de apreciação e conversão em lei pelo Congresso Nacional para se tornar definitiva no ordenamento jurídico. Caso não seja convertida em lei dentro do prazo estabelecido, ou seja rejeitada, perde sua eficácia desde a edição, e as relações jurídicas constituídas durante sua vigência devem ser disciplinadas por decreto legislativo do Congresso Nacional.
A disciplina atual das Medidas Provisórias é dada fundamentalmente pelo artigo 62 da Constituição Federal, com a redação conferida pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001, que estabeleceu importantes limitações e procedimentos.
Fundamentos
- Constituição Federal de 1988:
- Art. 59: “O processo legislativo compreende a elaboração de: (…) V – medidas provisórias;”
- Art. 62: Dispõe sobre a adoção de medidas provisórias pelo Presidente da República, os requisitos de relevância e urgência, as matérias vedadas, o trâmite no Congresso Nacional, os prazos de vigência e os efeitos de sua aprovação ou rejeição.
- § 1º: “É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:
I – relativa a:
a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral;
b) direito penal, processual penal e processual civil;
c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;
d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º;
II – que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro;
III – reservada a lei complementar;
IV – já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.”
(Matérias Vedadas) - § 2º: “Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.” (Princípio da Anterioridade Tributária)
- § 3º: “As medidas provisórias (…) perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável uma vez por igual período (…), devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes.”
- § 5º: “A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais.” (Controle dos Pressupostos pelo Legislativo)
- § 7º: “Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional.”
- § 9º: “Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional.”
- § 10: “É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.”
- § 11: “Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas.”
- § 12: “Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto.”
- § 1º: “É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:
- Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001: Alterou significativamente o art. 62 da CF/88, estabelecendo o regime jurídico atual das medidas provisórias.
Controle
- Supremo Tribunal Federal (STF):
- ADI 2.213-MC/DF (Rel. Min. Celso de Mello, DJ 23/04/2004): O STF reafirmou a possibilidade de controle judicial dos pressupostos de relevância e urgência, ainda que em caráter excepcional, e discutiu a vedação de reedição de Medida Provisória na mesma sessão legislativa.
- ADI 5.709/DF (Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ acórdão Min. Luiz Fux, DJe 12/04/2018): Discutiu a impossibilidade de MPV tratar de matéria eleitoral, reforçando as vedações do art. 62, § 1º, da CF.
- ADI 4.048/DF (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 08/05/2009): Analisou a aplicação do princípio da anterioridade nonagesimal a tributos instituídos ou majorados por medida provisória.
Enunciados
- S.M.J. não há registro(s) de súmulas vinculantes do STF tratando especificamente dos requisitos de “relevância e urgência” de forma genérica, embora existam inúmeras decisões. A análise é casuística.
Precedentes
- Supremo Tribunal Federal (STF):
- Diversos precedentes tratam da impossibilidade de Medida Provisória veicular matéria reservada à Lei Complementar ou sobre Direito Penal (salvo para beneficiar o réu, segundo parte da doutrina e jurisprudência em evolução).
Jurisprudência
- Supremo Tribunal Federal (STF):
- STF, Questão de Ordem na ADI 162-MC/DF (Rel. Min. Moreira Alves, DJ 19/09/1990) (anterior à EC 32/2001, mas com relevância histórica): O STF admitiu, em caráter excepcional, o controle jurisdicional dos pressupostos de relevância e urgência quando sua ausência é evidente.
Doutrina
- Conceito e Natureza Jurídica: Para Alexandre de Moraes (Direito Constitucional, Atlas), a Medida Provisória é um ato normativo editado pelo Presidente da República, com força de lei, em situações de relevância e urgência, que produz efeitos imediatos, mas necessita de posterior conversão em lei pelo Congresso Nacional. Possui natureza de ato legislativo excepcional do Poder Executivo.
- Pressupostos Constitucionais:
- Relevância: Importância da matéria para o interesse público.
- Urgência: Necessidade de disciplina normativa imediata, que não possa aguardar o trâmite regular do processo legislativo.
- A aferição desses pressupostos é primariamente política (Presidente e Congresso), mas o STF admite controle judicial em casos de abuso ou ausência manifesta.
- Matérias Vedadas (Art. 62, § 1º, CF/88): A EC 32/2001 ampliou o rol de matérias sobre as quais não se pode editar Medida Provisória, como direito penal (salvo, para alguns, in bonam partem), processual penal e civil, organização do Judiciário e MP, planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamento (com ressalvas), matéria reservada à lei complementar, entre outras.
- Trâmite no Congresso Nacional: A MPV é submetida a uma comissão mista de Deputados e Senadores, que emite parecer. Depois, é votada separadamente pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. O prazo de vigência é de 60 dias, prorrogável uma única vez por igual período. Se não apreciada em 45 dias da publicação, tranca a pauta da Casa em que estiver tramitando.
- Conversão em Lei, Rejeição ou Perda de Eficácia:
- Se aprovada, é convertida em lei, com sanção presidencial (se houver alterações) ou promulgação direta (se aprovada na íntegra).
- Se rejeitada (explícita ou implicitamente por decurso de prazo sem conversão), perde a eficácia desde a sua edição (efeitos ex tunc).
- Regulamentação das Relações Jurídicas: Se a MPV não for convertida em lei, o Congresso Nacional deve editar um decreto legislativo em até 60 dias para disciplinar as relações jurídicas constituídas durante sua vigência. Se não o fizer, essas relações continuam regidas pela MPV (art. 62, § 11, CF).
- Vedação de Reedição: A EC 32/2001 vedou a reedição, na mesma sessão legislativa, de MPV rejeitada ou que tenha perdido eficácia por decurso de prazo (art. 62, § 10, CF). Antes da EC 32/2001, a reedição ilimitada de MPs era uma prática comum e controversa.
- Controle Político (pelo Congresso Nacional):
- Análise dos pressupostos constitucionais de relevância e urgência.
- Apreciação e deliberação sobre o mérito da MPV, podendo convertê-la em lei (com ou sem alterações), rejeitá-la, ou deixar que perca a eficácia por decurso de prazo.
- Edição de decreto legislativo para disciplinar as relações jurídicas decorrentes de MPV não convertida em lei ou rejeitada.
- Controle Jurisdicional (pelo Poder Judiciário, especialmente o STF):
- Verificação da observância dos pressupostos constitucionais de relevância e urgência (controle excepcional, em casos de ausência manifesta).
- Análise da compatibilidade material da MPV com a Constituição, incluindo a observância das matérias vedadas.
- Pode ser exercido via Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ou Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).
Correlato
- Constituição Federal — estabelece o regime jurídico das Medidas Provisórias, principalmente no art. 62.
- Processo Legislativo — a Medida Provisória é uma espécie normativa que, para se tornar definitiva, passa por um rito específico no Congresso Nacional.
- Presidente da República — é a autoridade competente para editar Medidas Provisórias.
- Congresso Nacional — órgão responsável pela apreciação, conversão em lei, rejeição ou convalidação dos efeitos de Medidas Provisórias.
- Emenda Constitucional nº 32/2001 — principal alteração legislativa que definiu o atual regime das Medidas Provisórias.
- Relevância e Urgência — são os pressupostos constitucionais para a edição de Medida Provisória.
- Conversão em Lei — processo pelo qual a Medida Provisória se torna uma lei definitiva após aprovação pelo Congresso Nacional.
- Decreto Legislativo — instrumento utilizado pelo Congresso Nacional para disciplinar as relações jurídicas decorrentes de Medida Provisória não convertida em lei.
- Princípio da Anterioridade Tributária — a Medida Provisória que institui ou majora certos impostos deve observar regras específicas ligadas a este princípio.
- Controle de Constitucionalidade — mecanismo pelo qual se afere a compatibilidade da Medida Provisória com a Constituição, incluindo seus pressupostos e matérias vedadas.