- Conceito: Ato jurídico unilateral por meio do qual o titular de um direito real sobre um bem se despoja de sua titularidade com a finalidade precípua de se exonerar de uma obrigação propter rem (obrigação que acompanha a coisa) a ele vinculada.
- Natureza Jurídica: Causa extintiva de obrigação, que opera mediante a perda voluntária do direito real. É uma forma de renúncia qualificada pela finalidade liberatória.
- Fundamento Geral: Decorre da natureza ambulatória da obrigação propter rem. Se a obrigação segue a coisa, a abdicação do direito sobre a coisa rompe o nexo de imputação entre o devedor e a obrigação.
- Requisitos de Validade
- Elemento Subjetivo (Animus Derelinquendi Qualificado): A intenção específica de abandonar o bem não apenas para se despojar da propriedade, mas para se livrar do ônus (obrigação) que o acompanha.
- Elemento Objetivo (Corpus Derelictionis): O ato inequívoco de abandono da posse e do direito sobre a coisa.
- Previsão Legal: O abandono liberatório somente é admitido nas hipóteses expressa ou implicitamente autorizadas por lei.
- Capacidade do Agente: O renunciante deve possuir capacidade civil plena e, se for o caso, poderes específicos para alienar (art. 104, I, CC).
- Objeto Lícito e Possível: O direito sobre o qual recai o abandono deve ser passível de renúncia.
- Hipóteses Legais de Aplicação
- Direito de Vizinhança
- Despesas de conservação de muro divisório: O condômino de parede-meia pode eximir-se de contribuir para as despesas de conservação, renunciando ao seu direito (CC, art. 1.297, §1º c/c art. 1.306).
- Efeito: O outro consorte adquire a propriedade exclusiva sobre o muro.
- Despesas de conservação de muro divisório: O condômino de parede-meia pode eximir-se de contribuir para as despesas de conservação, renunciando ao seu direito (CC, art. 1.297, §1º c/c art. 1.306).
- Condomínio Geral (Voluntário)
- Dívidas do condomínio: O condômino pode renunciar à sua parte ideal para se eximir do pagamento das despesas e dívidas (CC, art. 1.316).
- Condição de Eficácia: A renúncia só terá efeito liberatório se os demais condôminos assumirem as despesas e as dívidas, caso em que a quota vaga lhes acresce na proporção dos pagamentos que fizerem (CC, art. 1.316, §1º e §2º).
- Dívidas do condomínio: O condômino pode renunciar à sua parte ideal para se eximir do pagamento das despesas e dívidas (CC, art. 1.316).
- Condomínio Edilício
- Despesas condominiais: Há controvérsia doutrinária sobre a plena aplicabilidade. A doutrina majoritária entende que o abandono da unidade autônoma para se eximir das cotas condominiais é possível, com base na natureza propter rem da dívida (CC, art. 1.345) e na aplicação analógica de outras normas.
- Procedimento: Exige um ato formal de renúncia à propriedade, que deve ser levado ao registro imobiliário. O condomínio pode, então, adjudicar a unidade ou levá-la a leilão para satisfazer o crédito.
- Despesas condominiais: Há controvérsia doutrinária sobre a plena aplicabilidade. A doutrina majoritária entende que o abandono da unidade autônoma para se eximir das cotas condominiais é possível, com base na natureza propter rem da dívida (CC, art. 1.345) e na aplicação analógica de outras normas.
- Perda da Propriedade por Abandono (Hipótese Correlata)
- Abandono de imóvel: O proprietário que abandona imóvel urbano ou rural, com a intenção de não mais o conservar e deixando de satisfazer os ônus fiscais, pode perdê-lo para o Município, Distrito Federal ou União (CC, art. 1.276).
- Distinção: Embora seja uma forma de abandono, o foco do art. 1.276 é a sanção pela inobservância da função social da propriedade, não a liberação de uma obrigação específica perante um credor particular. A presunção de abandono é absoluta com a cessação da posse e o não pagamento dos tributos (CC, art. 1.276, §2º).
- Abandono de imóvel: O proprietário que abandona imóvel urbano ou rural, com a intenção de não mais o conservar e deixando de satisfazer os ônus fiscais, pode perdê-lo para o Município, Distrito Federal ou União (CC, art. 1.276).
- Direito de Vizinhança
- Efeitos Jurídicos
- Para o Devedor (Renunciante):
- Extinção da Obrigação Propter Rem: Liberação do devedor de todas as obrigações futuras (ex nunc) e, a depender do caso e do momento em que ocorre, das obrigações pretéritas.
- Perda do Direito Real: O renunciante deixa de ser titular do direito de propriedade ou de outro direito real sobre a coisa.
- Para o Credor (ou Beneficiário):
- Consolidação da Propriedade: O credor (ex: o outro confinante no caso de muro) ou a coletividade (ex: os demais condôminos) pode adquirir a titularidade do direito abandonado.
- Sub-rogação no Direito de Excutir a Coisa: O credor passa a ter como única garantia o próprio bem, podendo levá-lo à execução para satisfazer seu crédito.
- Para o Devedor (Renunciante):
- Distinções em Relação a Figuras Afins
- Renúncia Abdicativa (Pura e Simples):
- Finalidade: Ato unilateral pelo qual o titular extingue um direito de seu patrimônio, sem transferi-lo a ninguém. Não possui a finalidade específica de liberar-se de uma obrigação.
- Formalidade: Quando recai sobre imóveis, exige escritura pública e registro (CC, art. 108 e Lei 6.015/73).
- Derrelição (Abandono de Coisa Móvel):
- Conceito: Ato de abandonar coisa móvel com a intenção de não mais a ter para si (animus derelinquendi). A coisa se torna res derelicta (coisa abandonada), suscetível de ocupação por outrem (CC, art. 1.263).
- Vínculo Obrigacional: Não está necessariamente atrelada à extinção de uma obrigação propter rem.
- Renúncia Translativa (Cessão ou Doação):
- Natureza: Negócio jurídico bilateral que implica a transferência de um direito a uma pessoa determinada. Na verdade, não é uma renúncia, mas sim uma aceitação seguida de alienação.
- Renúncia Abdicativa (Pura e Simples):