REsp 2.185.387-PR

Assunto/Tema Central: Configuração de dano moral indenizável decorrente de abordagem excessiva e revista vexatória realizada por agente de segurança privada de estabelecimento comercial contra menor de idade, sob suspeita infundada de prática de ato infracional análogo ao furto, caracterizando abuso de direito e violação à dignidade.
Palavras-chave: Dano Moral, Responsabilidade Civil, Relação de Consumo, Estabelecimento Comercial, Supermercado, Segurança Privada, Abordagem Abusiva, Revista Vexatória, Menor de Idade, Adolescente, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Ato Infracional Análogo ao Furto, Abuso de Direito, Dignidade da Pessoa Humana.

Tese Fixada

“Configura indenização por danos morais a abordagem excessiva de agente de segurança privada de supermercado à menor de idade, por suspeita de prática de ato infracional análogo ao furto, causando situação vexaminosa em frente aos outros clientes do estabelecimento comercial.”

Controvérsia

A controvérsia central consiste em definir se a abordagem realizada por agente de segurança privada de um supermercado a uma menor de idade, sob suspeita da prática de ato infracional análogo ao furto, configurou exercício regular de direito ou se caracterizou ato ilícito passível de indenização por danos morais, devido à forma como foi conduzida.

Contexto

Uma adolescente foi abordada por um segurança de supermercado na saída do estabelecimento, após ter pago por suas compras. Foi acusada de furto (não especificado qual produto) e revistada publicamente perto do guarda-volumes. Nada foi encontrado. A menor saiu do local chorando. A análise envolve a responsabilidade civil do estabelecimento em uma relação de consumo, bem como a proteção especial conferida a crianças e adolescentes pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Ratio Decidendi

A Terceira Turma do STJ, por unanimidade, concluiu pela configuração do dano moral, com base nos seguintes argumentos:

  1. Relação de Consumo: A situação de abordagem a clientes por suspeita de furto em estabelecimentos comerciais insere-se no âmbito das relações de consumo, atraindo a aplicação da legislação consumerista para a aferição da responsabilidade civil.
  2. Limites da Atuação da Segurança Privada: Embora a segurança privada seja permitida, sua atuação deve ser pautada pela prudência e respeito, garantindo a qualidade do serviço ao consumidor. O simples disparo de alarme sonoro seguido de revista pessoal, por si só, não configura dano moral, mas o tratamento abusivo ou vexatório sim.
  3. Distinção entre Revista e Busca Pessoal: A revista realizada por agentes de segurança privada é lícita, dentro de certos limites. Contudo, difere da busca pessoal, procedimento este previsto no art. 240 do Código de Processo Penal e restrito a autoridades judiciais, policiais ou seus agentes.
  4. Proteção Especial ao Adolescente (ECA): A abordagem a adolescentes deve ser ainda mais cuidadosa, considerando o direito ao respeito (art. 17 do ECA) e o dever de zelar por sua dignidade (art. 18 do ECA).
  5. Ônus da Prova do Estabelecimento Comercial: Em casos de alegação de excesso em abordagens por suspeita de furto, cabe ao estabelecimento comercial o ônus de comprovar a licitude do procedimento, demonstrando que não houve exposição, constrangimento ou agressão ao consumidor.
  6. Abuso de Direito no Caso Concreto: No caso específico, a abordagem à adolescente foi considerada excessiva, causando-lhe situação vexaminosa ao ser publicamente revistada e infundadamente acusada de ato infracional análogo ao furto. Tal conduta ultrapassou o exercício regular de direito e configurou abuso, gerando o dever de indenizar por danos morais.

Tese Afastada: A alegação de que a abordagem, da forma como foi realizada, constituiria mero exercício regular de um direito por parte do estabelecimento comercial.

Fundamentos

  • Lei n. 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA), arts. 17 e 18.
  • Código de Processo Penal (CPP), art. 240.
  • AgInt no AREsp 175.512/SP, Quarta Turma, DJe 25/10/2018.
  • HC n. 470.937/SP, Quinta Turma, DJe 17/6/2019.

Observações

  • Necessidade de Treinamento: A decisão reforça a importância do treinamento adequado das equipes de segurança de estabelecimentos comerciais para que atuem de forma eficiente, mas sempre respeitando a dignidade dos consumidores, especialmente crianças e adolescentes.
  • Proteção à Dignidade: Enfatiza a proteção à dignidade da pessoa humana, particularmente de menores, em situações de suspeita de ilícitos em ambientes de consumo.
  • Inversão do Ônus da Prova: Destaca a aplicação da inversão do ônus da prova em favor do consumidor quando alega excessos na abordagem, cabendo ao estabelecimento demonstrar a regularidade de sua conduta.
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