Assunto/Tema Central: Possibilidade de compensação entre parcelas inadimplidas de contrato de arrendamento mercantil (leasing) e o Valor Residual Garantido (VRG) a ser restituído ao arrendatário, mesmo que a pretensão de cobrança autônoma das parcelas inadimplidas venha a prescrever posteriormente, desde que as dívidas fossem exigíveis no momento em que coexistiram.
Palavras-chave: Direito Civil, Contrato de Arrendamento Mercantil (Leasing), Valor Residual Garantido (VRG), Inadimplemento Contratual, Rescisão Contratual, Compensação de Dívidas, Prescrição, Parcelas Inadimplidas, Exigibilidade da Dívida, Código Civil, Artigo 368 CC, Artigo 369 CC, Artigo 206 §5º I CC.
Tese Fixada
“A compensação das parcelas inadimplidas de contrato de arrendamento mercantil com o valor a ser restituído à arrendatária a título de Valor Residual Garantido (VRG) é possível quando as dívidas coexistem e são exigíveis, sendo irrelevante a prescrição posterior daquelas parcelas.”
Controvérsia
A controvérsia reside em definir se é admissível a compensação de parcelas não pagas de um contrato de arrendamento mercantil com o montante do Valor Residual Garantido (VRG) a ser devolvido ao arrendatário, especialmente quando a pretensão de cobrança judicial dessas parcelas inadimplidas já se encontra prescrita.
Contexto
Em contratos de arrendamento mercantil, o inadimplemento do arrendatário pode levar à rescisão antecipada do contrato e à reintegração do bem na posse do arrendador. Nesses casos, surge a discussão sobre a restituição de valores pagos a título de VRG e a possibilidade de compensá-los com débitos pendentes do arrendatário.
A pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento particular, como as parcelas do leasing, prescreve em cinco anos (art. 206, § 5º, I, do CC). A questão é se a prescrição da cobrança das parcelas impede sua compensação com o VRG.
Ratio Decidendi
A Quarta Turma do STJ, por unanimidade, entendeu pela possibilidade da compensação, mesmo com a prescrição superveniente das parcelas, desde que os requisitos para a compensação estivessem presentes quando as dívidas coexistiram, pelos seguintes motivos:
- Prescrição da Cobrança: A pretensão de cobrança das parcelas inadimplidas em contrato de arrendamento mercantil sujeita-se ao prazo prescricional de cinco anos (art. 206, § 5º, I, do CC).
- Compensação Legal (Arts. 368 e 369 do CC): Na rescisão antecipada do contrato por inadimplemento, com reintegração do bem, o saldo do VRG a ser restituído pode ser compensado com as parcelas vencidas e não pagas. A compensação é um meio de extinção de obrigações entre pessoas que são, ao mesmo tempo, credora e devedora uma da outra.
- Operatividade Ipso Iure da Compensação: A compensação legal opera automaticamente (ipso iure) no exato momento em que as dívidas recíprocas se tornam líquidas, vencidas (exigíveis) e fungíveis. A sentença que a reconhece tem natureza meramente declaratória, com efeitos retroativos (ex tunc) à data da coexistência dos débitos compensáveis.
- Prescrição e Exigibilidade para Compensação: Dívidas já prescritas no momento em que se pretende compensar não são passíveis de compensação, pois lhes falta o requisito da exigibilidade.
- Irrelevância da Prescrição Posterior: Contudo, se a prescrição da pretensão de cobrança de uma das dívidas se consuma após o momento em que ambas as dívidas coexistiram e eram exigíveis, tal prescrição superveniente não impede o reconhecimento dos efeitos da compensação que já se operou por força de lei.
- Momento da Coexistência das Dívidas no Leasing: No contrato de arrendamento mercantil, o momento crucial para a verificação da coexistência das dívidas compensáveis (crédito do arrendador pelas parcelas inadimplidas e crédito do arrendatário pela restituição do VRG) ocorre com a rescisão do contrato e a venda do bem. Nesse instante, ambas as obrigações se tornam exigíveis para fins de encontro de contas.
Tese Afastada: A ideia de que a prescrição da pretensão de cobrança das parcelas inadimplidas, mesmo que posterior ao momento em que se tornaram exigíveis e coexistiram com o crédito de VRG, impediria a compensação.
Fundamentos
- Código Civil (CC/2002), arts. 206, § 5º, I; 368 e 369.
Observações
- Segurança Jurídica na Compensação: A decisão traz clareza sobre os efeitos da prescrição na compensação legal, especialmente em contratos de trato sucessivo como o arrendamento mercantil, preservando os efeitos da compensação que já se operou legalmente antes da consumação da prescrição de uma das dívidas.
- Justiça Contratual: Permite um acertamento mais justo das contas entre as partes na rescisão do leasing, evitando que o arrendatário inadimplente se beneficie da prescrição para receber integralmente o VRG sem quitar suas obrigações pendentes que eram exigíveis no momento da apuração.