REsp 2.141.417-SC

Assunto/Tema Central: Inoponibilidade de contrato de promessa de compra e venda de imóvel comercial, não levado a registro no Cartório de Imóveis, a terceiro de boa-fé que posteriormente registrou hipoteca sobre o mesmo bem. Inaplicabilidade da Súmula 308/STJ a imóveis comerciais.
Palavras-chave: Direito Civil, Direito Notarial e Registral, Contrato de Promessa de Compra e Venda, Imóvel Comercial, Ausência de Registro Imobiliário, Hipoteca, Garantia Real, Terceiro de Boa-fé, Oponibilidade Erga Omnes, Princípio da Publicidade Registral, Súmula 308/STJ (inaplicabilidade), Penhora, Artigo 1.245 §1º CC.

Tese Fixada

“O contrato de promessa de compra e venda sem registro no Cartório Imobiliário, mesmo que celebrado antes da hipoteca, não é oponível a terceiro de boa-fé que recebeu o imóvel comercial como garantia real.”

Controvérsia

A controvérsia central reside em determinar a validade e eficácia de uma penhora judicial sobre imóvel comercial, decorrente de garantia hipotecária devidamente registrada, em face de um contrato de promessa de compra e venda do mesmo imóvel celebrado anteriormente à hipoteca, mas não levado a registro no Cartório de Imóveis.

Contexto

A Súmula 308/STJ estabelece que “a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”. Contudo, sua aplicação é restrita a imóveis residenciais no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH). No caso de imóveis comerciais, a ausência de registro da promessa de compra e venda ganha relevância central para a definição da oponibilidade do contrato a terceiros, especialmente credores hipotecários de boa-fé.

Ratio Decidendi

A Quarta Turma do STJ, por unanimidade, entendeu pela oponibilidade da hipoteca registrada em face da promessa de compra e venda não registrada, com base nos seguintes fundamentos:

  1. Inaplicabilidade da Súmula 308/STJ a Imóveis Comerciais: É pacífico no STJ o entendimento de que a Súmula 308/STJ não se aplica a contratos de aquisição de imóveis comerciais, incidindo apenas sobre imóveis residenciais no âmbito do SFH.
  2. Importância do Registro para Oponibilidade Erga Omnes: Conforme o art. 1.245, § 1º, do Código Civil, a propriedade do imóvel só se transfere com o registro do título translativo no Cartório de Registro de Imóveis. Antes do registro, a promessa de compra e venda gera apenas um direito pessoal ou obrigacional entre as partes contratantes. Somente o registro confere ao direito do promitente comprador oponibilidade contra terceiros (efeito erga omnes).
  3. Proteção ao Terceiro de Boa-Fé: Na ausência de registro da promessa de compra e venda, não se pode opor tal contrato a um terceiro de boa-fé que, confiando na publicidade do registro imobiliário, recebeu o imóvel comercial em garantia hipotecária e a registrou devidamente. O credor hipotecário que registra sua garantia age nos estritos termos da lei.
  4. Distinção de Precedentes: Embora haja precedentes indicando que, mesmo para imóveis comerciais, a hipoteca posterior à promessa de compra e venda não teria eficácia contra o promissário comprador (ex: AgInt no REsp n. 1.704.440/RS), tais julgados não examinaram a hipótese específica da ausência de registro público da promessa de compra e venda, que é o ponto crucial no presente caso.
  5. Direito Real vs. Direito Pessoal: O direito real do promitente comprador só se constitui e se torna oponível a terceiros com o registro. Sem ele, o credor hipotecário de boa-fé, que possui um direito real de garantia devidamente registrado, tem seu direito prevalecente.

Tese Afastada: A tese de que a promessa de compra e venda de imóvel comercial, mesmo não registrada, seria oponível à hipoteca posteriormente constituída e registrada por terceiro de boa-fé, levando à nulidade da penhora decorrente dessa garantia.

Fundamentos

  • Código Civil (CC/2002), art. 1.245, § 1º.
  • Súmula n. 308/STJ.
  • AgInt no REsp n. 1.702.163/PR, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 15/10/2019, DJe de 6/11/2019.
  • AgInt no REsp n. 1.704.440/RS, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 24/9/2019, DJe de 21/10/2019.

Observações

  • Diligência do Promitente Comprador: A decisão reforça a importância da diligência do promitente comprador em registrar seu contrato no Cartório de Imóveis para garantir a oponibilidade do seu direito a terceiros, especialmente em transações envolvendo imóveis comerciais.
  • Segurança Jurídica do Crédito Imobiliário: Privilegia-se a segurança jurídica conferida pelo sistema registral imobiliário, protegendo o terceiro de boa-fé que confia nas informações constantes da matrícula do imóvel para constituir garantias reais.
  • Distinção Crucial com Imóveis Residenciais (SFH): É fundamental distinguir a situação de imóveis comerciais daquela dos imóveis residenciais adquiridos no âmbito do SFH, para os quais a Súmula 308/STJ oferece uma proteção mais ampla ao adquirente, independentemente do registro da promessa.
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