Tema Repetitivo de Revista 70

O descumprimento da obrigação contratual de recolhimento dos depósitos de FGTS, seja pela ausência ou pela irregularidade, configura falta grave suficiente para caracterização da rescisão indireta do contrato de trabalho, mesmo se não houver a imediatidade?

A principal questão jurídica que o TST foi chamado a resolver de forma definitiva era:

O descumprimento da obrigação contratual de recolhimento dos depósitos de FGTS, seja pela ausência total ou pela irregularidade (atrasos, depósitos parciais), constitui falta grave do empregador suficiente para justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do artigo 483, alínea “d”, da CLT?

Além disso, uma segunda dúvida, igualmente relevante, precisava ser sanada:

Para que o empregado possa pleitear a rescisão indireta por essa razão, é necessário que ele aja com imediatidade, ou seja, logo após tomar ciência da primeira falha?

Havia uma forte divergência entre o entendimento consolidado no TST e as decisões de diversos Tribunais Regionais, o que gerava insegurança jurídica e um volume massivo de recursos sobre o mesmo tema.

Tabela Comparativa de Entendimentos Judiciais:

Posição do Tribunal Superior do Trabalho (TST)Posição Divergente de Tribunais Regionais (TRTs)
A ausência ou irregularidade no depósito do FGTS é, por si só, uma falta grave.A falha no depósito do FGTS não é grave o suficiente para justificar a rescisão.
Trata-se de um descumprimento direto da principal obrigação contratual do empregador.Seria uma irregularidade que poderia ser sanada posteriormente, via ação judicial, sem a necessidade de romper o contrato.
O requisito da imediatidade é flexibilizado ou dispensado, pois a falta se renova mês a mês.A demora do trabalhador em reclamar (falta de imediatidade) configuraria um “perdão tácito”, impedindo a rescisão.
Violação direta do artigo 483, “d”, da CLT e do direito fundamental do trabalhador (art. 7º, III, CF).O empregado que continua trabalhando, mesmo sem os depósitos, não demonstra que a relação se tornou insustentável.

Tese Firmada

Após analisar a jurisprudência pacificada em todas as suas oito Turmas e na Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1), o Tribunal Pleno do TST, em 24 de fevereiro de 2025, decidiu por unanimidade reafirmar sua posição, fixando a seguinte tese, que agora possui força obrigatória para todo o Judiciário Trabalhista:

“A ausência ou irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS caracteriza descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, “d”, da CLT, suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho, sendo desnecessário o requisito da imediatidade.”

Desdobramentos Práticos do Julgamento

Esta decisão tem implicações profundas e diretas para as relações de trabalho no Brasil.

Para o Empregado (Trabalhador):

  1. Segurança Jurídica: Você agora tem a certeza de que a falha no depósito do seu FGTS é motivo legal para pedir a rescisão indireta.
  2. Direito Potestativo: O direito de considerar o contrato rescindido é seu. O empregador que não deposita o FGTS dá a você a opção de sair do emprego recebendo todas as verbas rescisórias, como se tivesse sido demitido sem justa causa.
  3. Fim da Exigência de Imediatidade: Você não perde o direito de pedir a rescisão indireta se demorar para entrar com a ação. O TST entende que a falta do empregador se renova a cada mês em que o depósito não é feito, o que o protege contra o argumento de “perdão tácito”.
  4. Verbas Rescisórias Garantidas: Ao ter a rescisão indireta reconhecida por este motivo, você terá direito a:
    • Saldo de salário.
    • Aviso prévio indenizado.
    • Férias vencidas e proporcionais, com acréscimo de 1/3.
    • 13º salário proporcional.
    • Levantamento integral dos depósitos de FGTS (incluindo os que o empregador será obrigado a regularizar).
    • Multa de 40% sobre o saldo total do FGTS.
    • Seguro-desemprego (se preenchidos os demais requisitos legais).

Para o Empregador (Empresa):

  1. Alerta Máximo: A decisão serve como um aviso contundente. Manter os depósitos de FGTS em dia não é uma opção, mas uma das principais obrigações contratuais.
  2. Risco Elevado: O passivo trabalhista de uma empresa que falha com o FGTS é imenso. Além de arcar com todos os custos de uma demissão sem justa causa, a empresa pode perder um funcionário a qualquer momento por sua própria falha.
  3. Inviabilidade de Defesa: Argumentos como “dificuldade financeira temporária” ou “a falha é pequena e pode ser corrigida” não serão mais aceitos pela Justiça do Trabalho para afastar a rescisão indireta.
  4. Gestão Preventiva: É crucial que as empresas implementem controles rigorosos para garantir a regularidade mensal dos depósitos de FGTS. A negligência neste ponto pode levar a uma “hemorragia” de ações de rescisão indireta, comprometendo a saúde financeira e operacional do negócio.
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