Trata-se de um Mandado de Segurança do impetrante contra uma decisão judicial que determinou a suspensão de sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e de seu passaporte. Essa decisão foi proferida pelo Juízo da 19ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, em um processo de execução trabalhista.
O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, inicialmente, negou provimento ao Agravo Regimental interposto pelo impetrante, mantendo a decisão que indeferiu a petição inicial do Mandado de Segurança e extinguiu o feito sem resolução do mérito. Essa decisão baseou-se na Orientação Jurisprudencial nº 92 da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que afirma não caber Mandado de Segurança contra decisão judicial passível de reforma por meio de recurso próprio, mesmo que com efeito diferido.
No caso em questão, o ato impugnado determinou a suspensão da CNH e do passaporte do executado, ora impetrante. O Tribunal Regional considerou essa decisão passível de Agravo de Petição, nos termos do art. 897, a, da Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT), o que justificaria o não cabimento do Mandado de Segurança.
Fundamentos
O cerne da questão jurídica reside na constitucionalidade da utilização de medidas coercitivas atípicas, como a suspensão da CNH e do passaporte, para compelir o devedor a cumprir a obrigação estabelecida em título executivo judicial.
O Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.941/DF, declarou a constitucionalidade do art. 139, IV, do Código de Processo Civil de 2015. Esse dispositivo legal prevê a possibilidade de o juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.
A decisão do STF reconheceu a legitimidade da flexibilização da tipicidade dos meios executivos, como forma de garantir a efetividade da tutela jurisdicional, a razoável duração do processo e o respeito ao Poder Judiciário. As medidas atípicas, nesse contexto, visam compelir o devedor a adimplir a obrigação, combatendo a inércia e as manobras protelatórias.
No entanto, o TST, neste acórdão, faz uma importante ponderação: o Mandado de Segurança pode ser cabível em situações excepcionais, quando a medida atípica adotada resultar em consequências que extrapolem o razoável e atentem contra direitos fundamentais.
Em relação à suspensão do passaporte, o TST entendeu que a legalidade do ato pode ser excepcionalmente questionada por meio de Habeas Corpus, considerando a potencial restrição ao direito de locomoção do indivíduo.
Já no caso da suspensão da CNH, o TST reconheceu o cabimento do Mandado de Segurança quando o ato coator atinge o direito ao livre exercício profissional. Isso ocorre, por exemplo, quando o devedor exerce atividade remunerada que depende da habilitação, como é o caso dos motoristas profissionais.
Decisão
Diante do exposto, o TST decidiu declarar, de ofício, a carência de ação em relação ao pedido de cassação da ordem de suspensão do passaporte, extinguindo o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI e § 3º, do CPC de 2015, e dar provimento ao Recurso Ordinário para desconstituir a medida atípica de suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do impetrante, determinando a imediata liberação do documento.
Essa decisão representa um importante precedente na jurisprudência trabalhista, ao reconhecer os limites da utilização de medidas coercitivas atípicas na execução. O TST, em consonância com o STF, defende a busca pela efetividade da tutela jurisdicional, mas ressalta a importância de ponderar os direitos fundamentais em jogo, especialmente o direito ao livre exercício profissional.
Referências
TST- ROT-0015210-82.2023.5.03.0000, SBDI-II, rel. Min. Luiz José Dezena da Silva, julgado em 26/11/2024.