Trata-se de um Recurso de Revista interposto por um Reclamante contra uma decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-2). O TRT-2 havia negado provimento ao Agravo de Instrumento do Reclamante, mantendo a decisão de primeiro grau que indeferiu o processamento do Recurso Ordinário por deserção, em razão do não pagamento das custas processuais. O cerne da controvérsia reside na concessão da justiça gratuita, que foi indeferida pelo TRT-2 sob o argumento de que o Reclamante não comprovou a insuficiência de recursos, não obstante sua declaração de hipossuficiência econômica.

Fundamentos

Inicialmente, o Relator, Ministro Mauricio José Godinho Delgado, refuta a decisão do TRT-2 que denegou seguimento ao Recurso de Revista com base na Súmula 218 do TST. O Ministro argumenta que, em casos como o presente, em que o Recurso de Revista visa impugnar decisão regional que diverge da jurisprudência do TST, o recurso deve ser admitido, mesmo que a decisão regional tenha sido proferida em Agravo de Instrumento.

Para tanto, o Ministro se baseia em precedente da 3ª Turma do TST (Processo RR-10992-29.2020.5.03.0028) e em julgado da 7ª Turma (Processo RRAg-1000381-96.2018.5.02.0254), bem como na técnica da “distinguishing”, que permite afastar a aplicação de uma súmula em casos específicos. O Ministro Relator analisa a legislação pertinente à concessão da justiça gratuita, em especial o art. 790, § 3º e § 4º, da Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT), com a redação dada pela Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista).

O Acórdão destaca que a Reforma Trabalhista passou a exigir a comprovação da insuficiência de recursos para a concessão da justiça gratuita, o que, segundo o Ministro, configura uma exigência mais onerosa para o trabalhador do que aquela prevista no Código de Processo Civil ( CPC), que presume verdadeira a alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural (art. 99, § 3º, do CPC).

Diante dessa disparidade, o TST, por meio da Súmula 463, I, firmou o entendimento de que, para a concessão da justiça gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica. O Ministro defende que a comprovação da insuficiência de recursos pode ser feita mediante simples declaração da parte, mesmo em ações ajuizadas após a vigência da Lei nº 13.467/2017, com o intuito de garantir o amplo acesso ao Poder Judiciário. O Acórdão ainda ressalta que o fato de o Reclamante não mais se encontrar desempregado não afasta a presunção de veracidade da declaração de pobreza apresentada.

Decisão

O Ministro Godinho Delgado, em seu voto, acolhe o Agravo do Reclamante e determina o processamento do Agravo de Instrumento. Após análise do Agravo de Instrumento, o Ministro dá provimento ao recurso e determina o processamento do Recurso de Revista. No exame do Recurso de Revista, o Ministro afasta a preliminar de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, com base no art. 282, § 2º, do CPC. Adentrando o mérito do Recurso de Revista, o Ministro o conhece por contrariedade à Súmula 463, I, do TST e dá provimento ao recurso para deferir ao Reclamante os benefícios da justiça gratuita. Por fim, o Acórdão determina o retorno dos autos ao TRT-2 para julgamento do Recurso Ordinário, afastada a deserção.

Referências

TST- RR-1000764-11.2020.5.02.0511, 3ª Turma, rel. Min. Mauricio José Godinho Delgado, julgado em 3/12/2024.

Trata-se de um Recurso de Revista interposto por um exequente contra um acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região que, em sede de Agravo de Petição, determinou a revogação da penhora de 30% sobre os proventos de aposentadoria do executado. O exequente buscava a reforma da decisão para que a penhora fosse mantida, alegando que o executado não comprovou o comprometimento de sua renda pessoal a ponto de implicar ofensa à sua dignidade.

Ocorre que, após a decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que determinou a penhora de 30% dos proventos do executado, este foi diagnosticado com neoplasia maligna (câncer), cujo tratamento, segundo o Tribunal Regional, impõe-lhe despesas significativas. O Tribunal Regional, então, em atenção ao princípio da dignidade da pessoa humana, revogou a penhora, considerando que a manutenção da constrição implicaria ofensa à dignidade do executado, especialmente por se tratar de pessoa idosa, com proventos de aposentadoria como única fonte de renda, já comprometida com diversos empréstimos consignados e com o dispendioso tratamento oncológico.

Fundamentos

Com base no princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88), que garante condições mínimas de subsistência e acesso à saúde, o Tribunal Superior do Trabalho entendeu que a imposição de restrição ao executado, em tratamento de doença grave, afetaria sua subsistência, configurando afronta a esse princípio fundamental.

Além disso, o princípio da razoabilidade exige que a aplicação do direito seja feita de forma justa e proporcional, evitando excessos e injustiças. Nesse sentido, o TST ponderou os direitos do exequente e do executado e concluiu que a manutenção da penhora seria desproporcional diante da situação de saúde do executado.

A decisão também se apoia na Lei nº 14.238/21 (Estatuto da Pessoa com Câncer), que assegura às pessoas com câncer o acesso ao tratamento adequado e o exercício de seus direitos fundamentais, sendo que a manutenção da penhora, nessas circunstâncias, implicaria ofensa à dignidade pessoal do executado.

Ainda, fundamenta-se no art. 505, I, do CPC/15, que permite a modificação da coisa julgada em relações jurídicas de trato continuado quando há alteração no estado de fato ou de direito, reconhecendo que o diagnóstico de câncer do executado representa uma mudança relevante para revisão da decisão que determinou a penhora.

Por fim, o acórdão cita diversos julgados do TST que corroboram a possibilidade de modificação da coisa julgada em casos semelhantes, bem como precedentes que admitem a diminuição do percentual de penhora em situações de doença grave, em respeito ao princípio da razoabilidade.

Decisão

O Tribunal Superior do Trabalho, em decisão unânime, negou provimento ao Recurso de Revista interposto pelo exequente, mantendo a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região que revogou a penhora de 30% sobre os proventos de aposentadoria do executado. A decisão considerou que a manutenção da penhora, em face do diagnóstico de neoplasia maligna e das condições de saúde do executado, implicaria ofensa à sua dignidade pessoal, em consonância com o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da razoabilidade e o Estatuto da Pessoa com Câncer.

A decisão do TST tem como desdobramento prático a garantia da subsistência do executado, que poderá utilizar seus proventos de aposentadoria para custear o tratamento da doença e manter suas necessidades básicas. O acórdão reforça a jurisprudência da Corte no sentido de proteger a dignidade da pessoa humana em casos de doença grave, especialmente quando se trata de pessoa idosa com proventos de aposentadoria como única fonte de renda.

Referências

TST- RR-11108-92.2016.5.03.0022, 2ª Turma, rel. Min. Liana Chaib, julgado em 26/11/2024.

No caso em análise, a Petrobrás Transporte S.A. – Transpetro interpôs Recurso de Revista contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região que negou provimento ao seu Agravo de Petição. O recurso visava reformar o julgado que manteve a exigibilidade de um título executivo judicial, mesmo após o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do RE 1.251.927, ter ratificado a forma de cálculo do complemento da Remuneração Mínima por Nível e Regime (RMNR) utilizada pela Petrobras, a qual havia sido objeto de controvérsia.

Fundamentos

O Tribunal Superior do Trabalho (TST), ao analisar o Recurso de Revista, aprofundou-se na questão da coisa julgada e sua relação com a decisão do STF no RE 1.251.927. O cerne da questão residia em determinar se a decisão do STF, que havia ratificado a forma de cálculo do complemento da RMNR, teria aplicação imediata em processos que já se encontravam na fase de cumprimento de sentença, mesmo que o trânsito em julgado da sentença exequenda tivesse ocorrido antes da decisão do STF.

Para solucionar essa controvérsia, o TST recorreu ao Tema 360 da Tabela de Repercussão Geral do STF, que, ao reconhecer a constitucionalidade dos arts. 525, § 1º, III e §§ 12 e 14, e 535, § 5º, do Código de Processo Civil ( CPC), estabeleceu que, para o reconhecimento do vício de inconstitucionalidade qualificado, exige-se que o julgamento do STF, que declara a norma constitucional ou inconstitucional, tenha sido realizado em data anterior ao trânsito em julgado da sentença exequenda.

No caso em questão, o trânsito em julgado da sentença exequenda ocorreu em 25/9/2015, enquanto a decisão do STF no RE 1.251.927 teve seu trânsito em julgado publicado em 5/3/2024. Diante disso, o TST concluiu que a decisão do STF não repercutia no caso concreto, não havendo que se falar em inexigibilidade do título executivo.

Decisão

Diante da análise dos fatos e fundamentos, o TST decidiu por não conhecer do Recurso de Revista interposto pela Petrobrás Transporte S.A. – Transpetro. Isso significa que a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região foi mantida, e o título executivo judicial permaneceu exigível, mesmo após a decisão do STF no RE 1.251.927.

Referências

TST- RR-925-73.2011.5.11.0003, 1ª Turma, rel. Min. Luiz José Dezena da Silva, julgado em 27/11/2024.

Trata-se de um Mandado de Segurança do impetrante contra uma decisão judicial que determinou a suspensão de sua Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e de seu passaporte. Essa decisão foi proferida pelo Juízo da 19ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, em um processo de execução trabalhista.

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, inicialmente, negou provimento ao Agravo Regimental interposto pelo impetrante, mantendo a decisão que indeferiu a petição inicial do Mandado de Segurança e extinguiu o feito sem resolução do mérito. Essa decisão baseou-se na Orientação Jurisprudencial nº 92 da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que afirma não caber Mandado de Segurança contra decisão judicial passível de reforma por meio de recurso próprio, mesmo que com efeito diferido.

No caso em questão, o ato impugnado determinou a suspensão da CNH e do passaporte do executado, ora impetrante. O Tribunal Regional considerou essa decisão passível de Agravo de Petição, nos termos do art. 897, a, da Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT), o que justificaria o não cabimento do Mandado de Segurança.

Fundamentos

O cerne da questão jurídica reside na constitucionalidade da utilização de medidas coercitivas atípicas, como a suspensão da CNH e do passaporte, para compelir o devedor a cumprir a obrigação estabelecida em título executivo judicial.

O Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.941/DF, declarou a constitucionalidade do art. 139, IV, do Código de Processo Civil de 2015. Esse dispositivo legal prevê a possibilidade de o juiz determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.

A decisão do STF reconheceu a legitimidade da flexibilização da tipicidade dos meios executivos, como forma de garantir a efetividade da tutela jurisdicional, a razoável duração do processo e o respeito ao Poder Judiciário. As medidas atípicas, nesse contexto, visam compelir o devedor a adimplir a obrigação, combatendo a inércia e as manobras protelatórias.

No entanto, o TST, neste acórdão, faz uma importante ponderação: o Mandado de Segurança pode ser cabível em situações excepcionais, quando a medida atípica adotada resultar em consequências que extrapolem o razoável e atentem contra direitos fundamentais.

Em relação à suspensão do passaporte, o TST entendeu que a legalidade do ato pode ser excepcionalmente questionada por meio de Habeas Corpus, considerando a potencial restrição ao direito de locomoção do indivíduo.

Já no caso da suspensão da CNH, o TST reconheceu o cabimento do Mandado de Segurança quando o ato coator atinge o direito ao livre exercício profissional. Isso ocorre, por exemplo, quando o devedor exerce atividade remunerada que depende da habilitação, como é o caso dos motoristas profissionais.

Decisão

Diante do exposto, o TST decidiu declarar, de ofício, a carência de ação em relação ao pedido de cassação da ordem de suspensão do passaporte, extinguindo o processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, VI e § 3º, do CPC de 2015, e dar provimento ao Recurso Ordinário para desconstituir a medida atípica de suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do impetrante, determinando a imediata liberação do documento.

Essa decisão representa um importante precedente na jurisprudência trabalhista, ao reconhecer os limites da utilização de medidas coercitivas atípicas na execução. O TST, em consonância com o STF, defende a busca pela efetividade da tutela jurisdicional, mas ressalta a importância de ponderar os direitos fundamentais em jogo, especialmente o direito ao livre exercício profissional.

Referências

TST- ROT-0015210-82.2023.5.03.0000, SBDI-II, rel. Min. Luiz José Dezena da Silva, julgado em 26/11/2024.

Trata-se de um Agravo Interno em Embargos de Declaração em Embargos em Embargos de Declaração em Embargos de Declaração em Recurso de Revista, interposto pela Reclamante e outros, contra decisão favorável à Reclamada. O cerne da controvérsia reside na intempestividade do recurso de embargos, interposto após o prazo legal de oito dias úteis, em virtude de uma interrupção programada de energia elétrica no endereço residencial de um dos advogados dos autores.

Fundamentos

O Tribunal Superior do Trabalho, ao analisar o caso, fundamentou sua decisão no artigo 775, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que estabelece que os prazos devem ser contados em dias úteis, excluindo-se o dia do começo e incluindo-se o do vencimento.

Também considerou o artigo 775, § 1º, II, da CLT, que permite a prorrogação dos prazos em razão de força maior, desde que devidamente comprovada. Para tanto, destacou que a caracterização de força maior exige os requisitos essenciais de imprevisibilidade e inevitabilidade. Nesse contexto, a jurisprudência do TST reconhece a possibilidade de prorrogação de prazos em casos de força maior, mas não acolhe a interrupção programada de energia elétrica como um evento imprevisível e inevitável, afastando, assim, sua aplicação ao caso concreto.

Decisão

O Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, mantendo a decisão que considerou intempestivo o recurso de embargos. A Corte entendeu que a interrupção programada de energia elétrica não configura força maior, pois falta o requisito de imprevisibilidade. Ademais, o Tribunal observou que a parte era representada por diversos patronos, o que possibilitava a interposição do recurso por outros advogados, mesmo com a interrupção de energia no endereço de um deles.

Referências

TST-Ag-ED-E- ED-ED-RR-1570-15.2017.5.10.0004, SBDI-I, Min. Cláudio Mascarenhas Brandão, em 5/12/2024.

Trata-se de um recurso de revista interposto pela empresa contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região que homologou o pedido de desistência de uma ação trabalhista feito pelo reclamante, mesmo após a apresentação da contestação eletrônica pela reclamada.

Fundamentos

O cerne da questão reside na interpretação do art. 841, § 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que dispõe: “Oferecida a contestação, ainda que eletronicamente, o reclamante não poderá, sem o consentimento do reclamado, desistir da ação”.

A reclamada argumentou que a apresentação da contestação eletrônica, ainda que em modo sigiloso, impediria a desistência unilateral da ação pelo reclamante, com base na aplicação analógica do art. 485, § 4º, do Código de Processo Civil (CPC), que prevê a necessidade de consentimento do réu para desistência após a oferta da contestação.

O Tribunal Regional do Trabalho, por sua vez, entendeu que a contestação eletrônica, em modo sigiloso, não impediria a desistência unilateral da ação pelo reclamante, pois a efetiva apresentação da defesa se dá na audiência, após a tentativa de conciliação.

Decisão

O Tribunal Superior do Trabalho (TST), ao analisar o recurso de revista, reformou a decisão do Tribunal Regional do Trabalho. O TST decidiu que a apresentação da contestação eletrônica, mesmo em modo sigiloso, impede a desistência unilateral da ação pelo reclamante, sendo necessário o consentimento do reclamado para a desistência.

A decisão do TST se baseou na interpretação sistemática dos artigos 841, § 3º, e 847, caput, da CLT, e no art. 22 da Resolução CSJT nº 185 de 2017, que estabelecem que a contestação eletrônica, ainda que em modo sigiloso, configura a efetiva apresentação da defesa, e que o momento processual para desistência da ação pelo reclamante se encerra com a apresentação da contestação.

Referências

TST- RR-556-89.2023.5.08.0117, 5ª Turma, rel. Min. Breno Medeiros, julgado em 4/12/2024.

O Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Brasília ajuizou ação coletiva contra o Banco do Brasil, buscando o pagamento de duas horas extras diárias, no período de 16/12/2004 a 5/2/2013, aos exercentes das funções de analista/assessor pleno e sênior na Unidade de Gestão Previdenciária (UGP), do Distrito Federal. O sindicato argumentou que as reais atribuições dos substituídos não configuram direção, gerência, fiscalização, chefia ou outros cargos de confiança, não havendo fidúcia especial que justifique o enquadramento na jornada excepcional de oito horas diárias (art. 224 § 2º, CLT).

O Banco do Brasil, em sua defesa, arguiu a ilegitimidade ativa do sindicato, sustentando que os direitos pleiteados são heterogêneos e personalíssimos, exigindo produção individual de prova quanto a cada um dos substituídos. O juízo de primeiro grau acolheu a prefacial de ilegitimidade ativa e extinguiu o processo sem resolução do mérito. O sindicato, inconformado, interpôs recurso ordinário, que foi desprovido pelo Tribunal Regional do Trabalho.

Fundamentos

O Tribunal Superior do Trabalho, ao analisar o Agravo em Recurso de Revista interposto pelo Banco do Brasil, conheceu do Agravo e, no mérito, deu-lhe provimento para não conhecer do Recurso de Revista do sindicato-autor. O acórdão do TST destacou que a classificação de direitos como individuais homogêneos, presente no Código de Defesa do Consumidor, tem caráter prático e visa sistematizar o ajuizamento de ações coletivas. Para que os direitos sejam considerados individuais homogêneos, é necessário que as questões fáticas comuns prevaleçam sobre as individuais, o que não se verifica no caso em análise.

O art. 81, parágrafo único, inciso III, da Lei nº 8.078/90 define direitos ou interesses individuais homogêneos como aqueles decorrentes de origem comum. No entanto, o acórdão ressalta que a necessidade de produção de prova individualizada para cada substituído, a fim de verificar se as funções desempenhadas configuram ou não cargo de confiança, afasta a homogeneidade dos direitos.

Decisão

O Tribunal Superior do Trabalho, ao acolher o Agravo em Recurso de Revista interposto pelo Banco do Brasil, negou provimento ao Recurso de Revista interposto pelo sindicato-autor, mantendo a decisão do Tribunal Regional do Trabalho que havia julgado extinto o processo sem resolução do mérito.

A decisão do TST, ao negar a legitimidade do sindicato para pleitear horas extras em nome dos bancários, reforça a importância da análise da natureza dos direitos individuais para fins de ajuizamento de ações coletivas. No caso em questão, a necessidade de produção de prova individualizada para cada substituído, a fim de verificar se as funções desempenhadas configuram ou não cargo de confiança, afasta a homogeneidade dos direitos e impede o ajuizamento da ação coletiva.

Referências

TST-Ag-RR-1960-39.2014.5.10.0020, 5ª Turma, rel. Min. Morgana de Almeida Richa, julgado em 4/12/2024.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou ação civil pública contra empresa de viação aérea, alegando descumprimento da legislação trabalhista em relação a todos os seus empregados, incluindo aeroviários e operadores de telemarketing. O MPT formulou 46 pedidos, abrangendo direitos relativos à jornada laboral (horas extras, adicional noturno, intervalos intrajornada e interjornadas, sistema de marcação de ponto) e enquadramento em plano de cargos. Requereu ainda a exibição dos cartões de ponto e recibos salariais de todos os empregados.

O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região extinguiu a ação sem resolução de mérito, declarando a ilegitimidade ativa do MPT, sob o argumento de que os interesses em questão não eram homogêneos, mas individuais. O MPT interpôs recurso de revista contra a decisão do TRT.

Fundamentos

O acórdão em análise discute a legitimidade do MPT para ajuizar ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos, com base na Constituição Federal (artigos 127 e 129), na Lei nº 7.347/1985 (artigo 6º, inciso VII, alínea d) e na Lei nº 8.078/1990 (artigo 81, parágrafo único, inciso III).

O acórdão cita precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconhecem a legitimidade do MPT para ajuizar ação civil pública em defesa de interesses individuais homogêneos, além de jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que corrobora esse entendimento.

Decisão

O Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, decidiu não conhecer do recurso de revista interposto pelo MPT. A decisão considerou que, no caso em análise, os interesses dos empregados da empresa de viação aérea não se enquadram na categoria de individuais homogêneos, pois as condições de trabalho e os regramentos aplicáveis aos aeroviários e operadores de telemarketing são distintos, o que afasta a legitimidade ativa do MPT para ajuizar a ação civil pública.

A decisão do TST, ao negar provimento ao recurso do MPT, confirma a decisão do TRT da 2ª Região, que extinguiu a ação civil pública sem resolução de mérito, sob o fundamento de que os direitos pleiteados são heterogêneos e, portanto, não se enquadram na hipótese de legitimidade extraordinária do MPT para a propositura da ação civil pública.

Referências

TST- RR-1734-78.2014.5.02.0045, 5ª Turma, rel. Min. Morgana de Almeida Richa, julgado em 4/12/2024.

Trata-se do Recurso Especial nº 1.935.157 – MT (2021/0125800-1), em uma ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada pelo consumidor em decorrência de vícios apresentados em um veículo automotor zero quilômetro. Em 2017, o autor da ação adquiriu uma camionete junto à concessionária segunda ré. O veículo foi vendido com uma garantia de fábrica de 5 (cinco) anos. Contudo, menos de um ano após a aquisição, o automóvel apresentou problemas mecânicos de natureza grave enquanto o condutor realizava uma manobra de ultrapassagem, o que evidencia a severidade e o risco associado ao defeito.

No mesmo dia da ocorrência do fato, o veículo foi encaminhado às dependências da concessionária para os devidos reparos. Entretanto, o conserto não foi efetuado em tempo hábil. O automóvel permaneceu na posse da concessionária por um período de 54 (cinquenta e quatro) dias, sob a justificativa de falta de peças de reposição necessárias para a solução do problema. Durante todo esse ínterim, o consumidor ficou privado do uso de seu bem, sendo que, segundo os autos, nem a fabricante (primeira ré), nem a concessionária (segunda ré) apresentaram uma solução efetiva para o vício.

Diante da inércia das fornecedoras e dos prejuízos suportados, o consumidor viu-se obrigado a arcar com despesas adicionais, como a locação de outro veículo para suas necessidades e a contratação de serviços de frete. Em função desses transtornos, o recorrente ajuizou a referida ação judicial, pleiteando a condenação solidária das rés ao pagamento de uma indenização por danos morais no montante de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) e por danos materiais no valor de R$ 12.400,00 (doze mil e quatrocentos reais), ambos os valores a serem devidamente corrigidos.

Em primeira instância, o Juízo julgou os pedidos parcialmente procedentes. Reconheceu a responsabilidade solidária das rés pelo vício do produto e condenou-as ao pagamento de danos morais fixados em R$ 10.000,00 (dez mil reais). No que tange aos danos materiais, a condenação abrangeu os custos com a locação de veículo e os fretes realizados, porém, restringiu o ressarcimento ao período que se iniciou após o 30º dia de imobilização do veículo.

Inconformado com a limitação imposta à reparação material, o autor interpôs recurso de apelação perante o Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso. Contudo, a corte estadual manteve o entendimento de primeira instância, afirmando que a indenização pelo dano material seria cabível “apenas em relação ao período que ultrapassar os 30 dias previstos no art. 18 do CDC”. Foi contra essa decisão que o consumidor interpôs o Recurso Especial ao Superior Tribunal de Justiça.

Fundamentos

O cerne da controvérsia levada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) consistiu em definir se a responsabilidade do fornecedor por danos materiais decorrentes de vício do produto deve ser limitada temporalmente, excluindo-se os prejuízos sofridos pelo consumidor durante o prazo de 30 (trinta) dias que a lei lhe confere para sanar o defeito, conforme previsto no art. 18, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

O Ministro Relator, Antonio Carlos Ferreira, em seu voto, rechaçou a interpretação restritiva adotada pelas instâncias ordinárias. O principal fundamento para a reforma da decisão foi o Princípio da Reparação Integral, consagrado no art. 6º, inciso VI, do CDC, que assegura ao consumidor “a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”. Segundo o Ministro, este princípio é um direito básico do consumidor e orienta todo o microssistema consumerista, não admitindo a imposição de limitações temporais que resultem em prejuízo para a parte vulnerável da relação de consumo.

A análise do STJ estabeleceu que o prazo de 30 dias mencionado no art. 18, § 1º, do CDC, não funciona como uma excludente de responsabilidade ou uma espécie de “franquia” ou “período de tolerância” concedido ao fornecedor para que o consumidor suporte os prejuízos decorrentes do vício sem qualquer tipo de compensação. A interpretação correta do dispositivo, de forma sistemática com os demais preceitos do CDC, é que ele estabelece um marco temporal para o surgimento de direitos potestativos ao consumidor. Ou seja, uma vez transcorrido o prazo de trinta dias sem que o vício seja sanado, o consumidor passa a ter o direito de exigir, à sua escolha: (i) a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; ou o abatimento proporcional do preço.

O acórdão deixa claro que a faculdade de reparo em 30 dias é um direito do fornecedor, mas o exercício desse direito não o isenta do dever de indenizar o consumidor por todos os prejuízos que este venha a sofrer desde o primeiro dia em que foi privado do uso do bem, caso o vício seja judicialmente reconhecido. Entender de forma diversa, segundo o relator, significaria uma “verdadeira transferência dos riscos da atividade empresarial para o adquirente do bem”, o que contraria a lógica e a finalidade do sistema de proteção ao consumidor.

Para robustecer sua tese, o Ministro Relator invocou a doutrina de Leonardo Roscoe Bessa, que, em sua obra “Código de defesa do consumidor comentado”, defende a tese da reparação integral. Bessa argumenta que, embora o fornecedor tenha o direito de reter o bem para reparo, nasce concomitantemente o dever de indenizar o consumidor pelos prejuízos sofridos nesse período, com base no art. 6º, VI, do CDC. O doutrinador chega a recomendar, como prática preventiva para os fornecedores, a disponibilização de um produto similar ao consumidor durante o período de conserto, a fim de afastar ou mitigar uma futura condenação por danos materiais.

Adicionalmente, o voto citou jurisprudência da própria Quarta Turma do STJ, especificamente o REsp n. 1.297.690/PR, de relatoria do Ministro Marco Buzzi, julgado em 4 de junho de 2013. Nesse precedente, a Corte já havia firmado o entendimento de que a interpretação do art. 18, § 1º, do CDC deve ser sempre favorável ao consumidor, sendo “terminantemente vedada a transferência, pelo fornecedor de produtos e serviços, dos riscos da sua atividade econômica”.

No que tange ao pleito de majoração da indenização por danos morais, fixada em R$ 10.000,00, o STJ aplicou o seu entendimento consolidado, materializado na Súmula n. 7/STJ. A Corte Superior entende que a revisão do quantum indenizatório em sede de recurso especial é medida excepcional, cabível apenas quando o valor arbitrado nas instâncias de origem se mostrar irrisório ou exorbitante, violando flagrantemente os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. No caso concreto, o Tribunal considerou que o valor de R$ 10.000,00 não se enquadrava em nenhuma dessas hipóteses, não destoando dos parâmetros adotados pela Corte em casos análogos, o que impede o reexame da matéria por demandar o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos.

Decisão

Diante dos fatos e fundamentos expostos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento presidido pelo Ministro João Otávio de Noronha e com a participação dos Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e Marco Buzzi, que acompanharam o relator, decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso especial.

A decisão reformou o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso no ponto específico da controvérsia. O desdobramento prático e o efeito jurídico principal da decisão foi a condenação solidária das empresas recorridas, ao ressarcimento integral dos danos materiais suportados pelo recorrente.

Isso significa que a indenização pelos gastos com aluguel de veículo e contratação de fretes deverá abranger todo o período em que o consumidor ficou privado do uso de sua camionete, qual seja, os 54 dias em que o bem esteve na concessionária para reparo. A decisão do STJ afastou expressamente a limitação imposta pelas instâncias ordinárias, que restringia o ressarcimento apenas ao período que excedeu os 30 dias iniciais. A apuração do montante exato a ser ressarcido foi relegada à fase de liquidação de sentença, conforme já havia determinado o juízo de primeiro grau.

Por outro lado, o pedido do recorrente para majorar o valor da indenização por danos morais foi negado. O STJ manteve o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) fixado pelo juízo de origem, por entender que o valor não era irrisório nem exorbitante, aplicando a Súmula n. 7/STJ para não reexaminar a questão. Como resultado deste julgamento, o Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese jurídica, que servirá de orientação para casos futuros análogos:

1. O prazo de 30 dias do art. 18, § 1º, do CDC não limita a responsabilidade do fornecedor, devendo o consumidor ser ressarcido integralmente pelos danos materiais sofridos.

2. A indenização por danos morais deve observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, não cabendo revisão quando o valor não se mostra irrisório ou exorbitante.

A decisão representa um importante precedente na defesa dos direitos do consumidor, reforçando o princípio da reparação integral e estabelecendo que os ônus e riscos da atividade empresarial não podem ser transferidos ao consumidor, mesmo que temporariamente, durante o prazo legal para o conserto de um produto defeituoso.

Referências

REsp n. 1.935.157/MT, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 22/4/2025, DJEN de 29/4/2025.

Trata-se de agravo de instrumento interposto pela União em face de decisão que determinou o fornecimento do medicamento Canabidiol Prati-Donaduzzi 20 mg/ml em favor de um menor, representado por sua genitora, para tratamento de sequela de infecção congênita por Zika Vírus, com microcefalia, hidrocefalia, paralisia cerebral quadriplégica espástica e epilepsia de difícil controle.

Fundamentos

A União argumentou que o prazo concedido para cumprimento da determinação era insuficiente, não havia evidências científicas comprovadas acerca da eficácia do medicamento, e que era imprescindível a realização de perícia prévia como requisito para a concessão do fármaco. Alegou ainda ofensa ao postulado da reserva do possível e que a CONITEC avaliou a incorporação do Canabidiol 200mg para tratamento de epilepsia refratária em crianças e adolescentes refratários aos tratamentos convencionais. Sustentou a existência de tratamentos alternativos fornecidos pelo SUS e que a parte não atendeu aos requisitos do Tema 500 do STF para concessão de medicamentos não registrados na Anvisa. Defendeu a necessidade de dilação do prazo para cumprimento da determinação para, no mínimo, 60 dias, e a exclusão da multa imposta, ou, caso mantida, a redução do valor diário. Por fim, requereu a divisão dos custos advindos do cumprimento da decisão entre os integrantes do polo passivo.

O Desembargador Relator, Carlos Augusto Pires Brandão, refutando os argumentos da União, destacou que a saúde é direito de todos e dever do Estado, nos termos dos artigos 6º e 196 da Constituição Federal, e que o postulado da reserva do possível não se aplica a demandas de saúde.

Esclareceu que o Tema 500 do STF, que dispõe sobre o fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa, não incide sobre o caso em questão, pois o medicamento em discussão possui autorização de importação, sendo regido pelo Tema 1.161 do STF.

O Tema 1.161 do STF prevê o fornecimento de medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento, e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS.

No caso em análise, o medicamento possui autorização de importação emitida pela Anvisa e autorização para comercialização no Brasil, o que supre a ausência do registro. Ademais, os requisitos do Tema 1.161 do STF foram cumpridos em sua integralidade, visto que a incapacidade econômica da parte resta presumida por ser assistida pela Defensoria Pública da União e o medicamento ser de alto custo, além de não haver substituto terapêutico com registro no Brasil.

O relator também afastou a necessidade de perícia prévia, considerando que o Tema 1.161 do STF não a exige como requisito para a concessão judicial de medicamentos da espécie, e que os autos contam com documentos elucidativos suficientes a demonstrar a necessidade do tratamento pelo paciente, nos termos dos artigos 464, § 1º, inciso II, e 472 do Código de Processo Civil.

No que tange à multa imposta, o relator a afastou, sob o fundamento de que não houve comprovação de recalcitrância da parte recorrente no cumprimento da decisão judicial, e que, ao contrário, há provas do efetivo cumprimento da decisão.

Por fim, o relator declarou a possibilidade de rateio dos custos da medicação com o ente estadual, caso o financiamento do fármaco não seja de competência exclusiva da União, conforme as normas que regem o Sistema Único de Saúde, com ressarcimento a ser feito exclusivamente na esfera administrativa, nos termos do Tema 1.234 do STF.

Decisão

Diante do exposto, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região deu parcial provimento ao agravo de instrumento para excluir a multa imposta e declarar a possibilidade de rateio dos custos da medicação com o ente estadual, caso o financiamento do fármaco não seja de competência exclusiva da União, conforme as normas que regem o Sistema Único de Saúde, com ressarcimento a ser feito exclusivamente na esfera administrativa.

Referências

TRF1 – AI 1044293-67.2023.4.01.0000 – PJe, rel. des. federal Carlos Augusto Pires Brandão, em sessão virtual realizada no período de 03 a 07/02/2025.

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